Continuando nossa série de posts sobre administração japonesa, gostaríamos de falar sobre o seu maior mérito: desviar o foco da fabricação das economias de escala para “economia de tempo”. Para isto, utilizaram 3 formas.
Quais os 3 focos da Administração Japonesa?
Primeiro todo funcionário tornava-se um verificador da qualidade, responsável por identificar os erros à medida que vão acontecendo e corrigindo-os imediatamente. Em vez de criar um departamento de qualidade ou melhoria, como a maioria das empresas faz, a Toyota dava aos operários o direito de interromper a linha de produção assim que identificassem algum erro – daí todas essas cordas penduradas ao longo da linha de produção.
Segundo, a introdução do just-in-time. No resto do mundo, os fabricantes faziam seus componentes somente “caso” fossem necessários. Enchiam caixas, paletes e depósitos com peças caras suficientes para dias ou semanas, que acumulavam poeira até serem finalmente necessárias. Os japoneses começaram fabricando componentes jit: as peças chegavam quando eram necessárias na linha de produção.
Terceiro, poupava-se tempo também seguindo o princípio de “puxar a demanda”. Nas fábricas ocidentais, os componentes tradicionalmente eram entregues em arranjos “determinados pelo fornecedor”, e as mercadorias se acumulavam quando não eram necessárias. Com o sistema de produção puxada pela demanda, as mercadorias eram fabricadas sob encomenda. Na Toyota, existe um kanban, ou cartão, acoplado a cada caixa de peças, que descreve seu conteúdo.
Enviando de volta o cartão ao fornecedor, ele fará imediatamente um pedido de reposição que logo será expedido. O sistema de produção puxada pela demanda chega até o consumidor. Em vez de esperar que os clientes entrem na revendedora Toyota local e expressem sua preferência por um carro específico, a Toyota possui um exército de vendedores domiciliares de automóveis. A teoria é que os clientes lhes dirão que tipo de carro eles desejam e a fábrica, os produzirá sob encomenda.
Qual é a falácia da economia de escala?
Este procedimento desafia a base da produção em massa como um todo, que foi (e em muitas partes do mundo continua sendo) a filosofia de produção dominante. A produção em massa depende de economias de escala e de especialização. Supõe-se que os trabalhadores precisam se tornar cada vez mais especializados a fim de executar seu trabalho com maior eficiência. E as fábricas precisam aumentar cada vez mais de tamanho a fim de obter economias de escala. Como os japoneses perceberam, entretanto, este sistema também implica dóis sérios custos.
Primeiro, o sistema clássico de produção em massa não consegue responder às rápidas mudanças na demanda. Os produtores em massa tendem a ser muito mais hábeis na manutenção de projetos padronizados do que na experimentação de novos produtos, em parte devido aos altos custos das mudanças na linha de produção e em parte porque seus trabalhadores especializados estão mais felizes com o que sabem.
A produção
Caso houver uma mudança, a fábrica talvez tenha que ficar fechada durante meses, para que as máquinas sejam reajustadas e os funcionários retreinados. Os produtores também podem ter que se desfazer de estoques imensos, que acarretaram altos custos de armazenamento, mas que se tornaram obsoletos. Quando a fábrica for capaz de produzir em massa o novo produto, a demanda por ter mudado mais uma vez.
Grandes empresas que se arriscam no aumento de suas inovações, tem que trabalhar com linhas flexíveis, caso contrário, podem incorrer em problemas deste tipo. Imaginem que de 30 lançamentos, 50% emplaquem. O que pode ser visto com otimismo por uma fábrica flexível, pode ser um problemão para a produção em massa.
O segundo complicador é que o sistema gera um índice inaceitavelmente alto de produtos defeituosos. Em lotes grandes, é difícil detectar defeitos. Uma peça defeituosa talvez só se revele quando o carro pronto finalmente der defeito. Os japoneses argumentaram que é mais fácil para a próxima pessoa na linha de montagem verificar um pequeno lote. E é mais provável que o operário que gera apenas um pequeno lote sinta-se como um artesão, enquanto a produção em massa normalmente alcança suas economias de escala tornando o trabalho altamente cansativo.
Como se dá a produção enxuta?
Já a produção enxuta, continua a envolver pelo menos alguns dos dons intelectuais dos trabalhadores. Eles podem ver o resultado do seu trabalho – positivo ou negativo – sobre o processo de fabricação da empresa. Seus colegas de trabalho parabenizam com tapinhas nas costas um trabalho bem feito e lançam olhares quando o trabalho é malfeito.
O a produção enxuta força o conceito de responsabilidade, tornando todos conscientes não só do que estão fazendo, mas também da qualidade do que estão fazendo. Essa informação é comunicada nos “círculos da qualidade” – sessões nas quais as pessoas discutem seu desempenho e a qualidade que produziram. Os operários também recebem continuamente informações sobre o trabalho: daí os quadros eletrônicos visíveis em todas as estações de trabalhos das fábricas da Toyota. Criar uma maneira das equipes medirem seu desempenho em tempo real é uma das disciplinas da execução que ministramos em nosso curso.
Produção enxuta significa também repensar as fronteiras da empresa – em particular, seu relacionamento com seus fornecedores. No Ocidente, este relacionamento assumiu duas formas. Inicialmente, os fabricantes tentaram produzir praticamente todas as peças, em divisões especiais montadas para esse propósito. Quando a opinião voltou-se contra essa “integração vertical”, as empresas ocidentais optaram por um sistema organizado em torno de fornecedores concorrentes. Nesse caso, ofereceram um projeto detalhado do que desejavam a um grande número de fornecedores e, em seguida, um contrato de um ano aos fornecedores capaz de oferecer o melhor preço.
Kaizen e Consenso
Dois ingredientes são indispensáveis na hora de formularmos as hipóteses sobre as causas do sucesso do Sistema Toyota de Produção: doutrina da melhoria contínua, ou kaizen; e o consenso, especialmente quando aplicado ao pensamento estratégico de longo prazo. O trabalho de Kenichi Ohmae oferece insights sobre estes dois conceitos.
Ohmae inseriu nos seus vários livros, exemplos de como funcionam as empresas japonesas e ao mesmo tempo, com críticas abertas às empresas americanas. Mesmo em seus livros globais mais recentes, quase todos os exemplos memoráveis, como a invenção de um assento de vaso sanitario aquecido com um bidê controlado eletronicamente, foram frutos do sistema de administração japonesa.
Como o Kaizen impulsiona a Inovação?
Ele escreve bem sobre inovação e valoriza muito os revolucionários. É favorável à dividir o orçamento para pesquisa em três partes: pesquisas de rotina (para acompanhar os concorrentes ou tentar baratear os próprios produtos), uma para pesquisas estratégicas de longo prazo e uma para eventuais projetos. Em geral, Ohmae exalta o estilo japonês de fabricar novos produtos por meio da melhoria contínua.
Ele também argumenta que, para ser útil, a inovação precisa agregar valor para os clientes. Ele tende a desprezar grandes projetos de P&D, como a televisão de alta definição, e delicia-se em vencer desafios de forma incremental, particularmente no universo comum. Será que é possível fazermos uma cafeteira melhor – não apenas com muitos dispositivos sofisticados, mas que realmente faça um café melhor?
Sim, descobrimos, se acrescentarmos um purificador de água, pois o sabor do café depende tanto da qualidade da água quanto da forma de percolar o grão de café. É possível fazer uma máquina fotográfica melhor? Sim, se o foco for automático e incluindo um flash automático.
Como a Estratégia se conecta ao kaizen?
A estratégia das inúmeras e pequenas melhorias ajusta-se bem ao conceito de produção enxuta. Se a linha de montagem é flexível, ela pode ser facilmente alterada a fim de incorporar um novo insight e incluir uma inovação recente. Significa também a capacidade de atacar o mercado com novas versões do mesmo produto. Exemplos como estes são vários, como o Walkman, câmeras e diferentes tipos de tecnologia.
Tal ênfase na melhoria – que está rapidamente atualizando os modelos e fazendo acréscimos engenhosos, como espelhos e limpadores de pará-brisas com temporizador – ajudou os fabricantes de automóveis japoneses a sair na frente de seus rivais. Já os fabricantes americanos, preferem focar na “grande sacada” em seus projetos de pesquisa – legado, do projeto Apollo.
Os japoneses combinam a inovação de sustentação (melhoria contínua) implacável no desenvolvimento de produtos com a estratégia de longo prazo de buscar o consenso entre os envolvidos nesse desenvolvimento. Ohmae observa que os ocidentais espelharam-se nos militares, com claras linhas de comando e uma distinção rígida entre os postos mais altos (os que pensam) e o resto, as empresas japonesas têm suas raízes em comunas da aldeia. Simplificando de uma maneira grosseira, ele diz que para administração japonesa todos os membros das aldeias são iguais e generalistas. Em vez de dar ordens do topo, as empresas japonesas preferem enfatizar o nemawashi (construção do consenso) e o ringi (processo decisório compartilhado).
Como criar Consenso?
Desta forma, espera-se que toda decisão surja de uma incansável discussão, já que os gerentes serão obrigados a obter o apoio entusiástico de seus funcionários. Enquanto os chefes americanos são impacientes e tiranos, os japoneses são modestos e reservados; enquanto os americanos vivem para tomar decisões, os japoneses preferem deixar que as decisões se tomem sozinhas. Eles comparam liderança ao ar – necessário para a vida, mas invisível e pouco sólido.
Ascendem na hierarquia da empresa por terem um desempenho melhor do que o de seus colegas, colocando religiosamente o grupo antes do indivíduo. Quando no topo, lideram por consenso, em vez de comandar. Não é incomum que os líderes sentem-se em silêncio durante grande parte de uma reunião, enquanto seus subordinados discutem os prós e contras da política. A arte da liderança é descobrir o desejo do grupo, não entusiasmar a organização com o carisma pessoal.
Quanto à estratégia de longo prazo, também há diferenças. No Ocidente, estrategistas profissionais ajudam a formular metas claras e definidas e suas formas de implementação, e tudo é colocado no papel, em planos formais. Na administração japonesa, a estratégia é livremente gerada por toda a organização e expressa em termos de visões e missões no lugar de planos precisos. Para a mente ocidental, essa é a receita para o desastre.
Porém, segundo Ohmae, os japoneses podem fazê-lo porque isso se ajusta ao sistema geral de emprego vitalício. Assim, os trabalhadores essenciais identificam-se com o futuro de longo prazo da empresa. O hábito japonês de realizar rodízios de pessoas entre departamentos diferentes os força a pensar como estrategistas. E como todos precisam começar pelo chão-de-fábrica, os gerentes seniores conhecem bem o que está acontecendo no âmago de suas organizações.
O sol nascente se pôs na década de 90
O sistema japonês teve um sucesso extraordinário. Na década de 80 as empresas japonesas dominavam as norte-americanas. Porém, em meados da década de 90, as coisas mudaram. À medida que as empresas japonesas começaram a lutar para sair de uma prolongada recessão e da carga de uma moeda cara, a maioria das empresas ocidentais já havia revertido a situação de crise. Depois deste período, entendeu-se quais empresas permaneceram sólidas e quais acabaram naufragando. No caso da Toyota, ela continuou crescendo e chegou à liderança mundial em lucro em vendas, mas outras, não tão ágeis para adaptar-se às mudanças, acabaram ruindo.
A retomada
Atualmente, o país continua sendo o principal centro mundial de excelência em produção. E as empresas japonesas mostraram seu talento para transformar a adversidade em vantagem. Como há escassez de recursos naturais no país, o governo investe pesado em educação. Duas crises do petróleo e várias altas do iene funcionaram como grande estímulo à inovação industrial e gerencial. Várias vezes, as exportações de carros japoneses para os EUA caíram após altas da moeda; em todas as ocasiões, a Toyota encontrou novas formas de tornar a produção enxuta ainda mais enxuta e voltar a exportar para Detroit.
Kobayashi, célere dos jovens gerentes japoneses, argumenta que a classe precisa aprender a tomar decisões difíceis e a vendê-las, tanto dentro de suas empresas quanto em todo o mundo, para que os funcionários e pessoas de fora possam ver a lógica por trás de soluções pouco palatáveis. Abordados no Green Belt e Black Belt.